O sopro que soltou o aroma amargo
do muro rumo às espirais dos vales,
e te despenteou no seu assalto largo
novelo breve contra um céu bem alvo;
a rajada que colou a ti as vestes
e em ti rápida modelou a sua imagem,
pôde voltar na tua ausência a estes
calhaus que o monte lança à voragem;
e como sossegada a ébria sede
volta a ver o jardim o ténue hálito
que te embalou, estendida sobre a rede,
por entre as árvores, nos teus voos sem alas.
Ai de mim, nunca duas vezes configura
o tempo de igual maneira as suas contas! E a salvação
está aí: que, se o mesmo acontecesse na natura
a nossa fábula arderia num clarão.
Jorro que não repete -, e que ora vive
num grupo de moradas que deitadas
ante o olhar no flanco de um declive
de galas e pendões ornamentadas.
O mundo existe...um torpor sustém assim
o coração que aos vagos pesadelos claudica,
mensageiros nocturnos: e não acredita
que os homens famintos façam um festim.
Eugenio Montale, Poesia, Assírio e Alvim, José Manuel de Vasconcelos (trad.), 2004.
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