domingo, 9 de agosto de 2009

Algumas considerações sobre o último romance de Nabokov, «The Original of Laura»

Depois de 30 anos guardado num cofre suíço, quando a intenção expressa de Nabokov era que fosse destruído, a Knof conseguiu publicar este último texto do autor. Não tendo lido o livro, acho contudo curioso que de um mero resumo ou plano, que é isto que a crítica me leva a crer que seja, se queira vir a falar dele como quem fala de um romance acabado.
Creio que é desleal para com o génio Nabokov, que, ao contrário de Kafka, que tal como ele deixou indicações expressas para que a sua obra fosse destruída (sendo este caso diferente, eram obras acabadas e, felizmente para a história da literatura universal, o amigo Max Brod desrespeitou as suas disposições testamentárias) ou de Flaubert, que tinha o Bouvard e Pécuchet quase quase acabado e possuía um resumo final bastante detalhado, ao contrário destes, Nabokov deixou o seu último livro francamente inacabado. Penso que uma obra cujas as últimas linhas são dedicadas à consideração sobre sinónimos de «efface» não deve ser submetida aos critérios avaliativos pelos quais foram ajuizados todos os outros romances de Nabokov, que se contava entre os mais geniais autores do séc. XX, século talvez pródigo como nenhum outro em produzir génios literários.
Esta publicação, contudo, parece-me que se torna valiosa se considerarmos as portas que nos abre para o estudo do processo criativo em Nabokov, para se averiguar da forma como funcionava a sua oficina de escrita. Considerada deste ponto de vista, creio que se tornará um documento valioso para qualquer estudante ou interessado no autor de Lolita e nas forças que norteavam os processos criativos da sua escrita. Fica um excerto da crítica, link incluído, publicada em Publishers Weekly.

This very unfinished work reads largely like an outline, full of seeming notes-to-self, references to source material, self-critique, sentence fragments and commentary (“The whole scene was pretty artificial in a fishy theatrical way”). It would be a mistake, in other words, for readers to come to this expecting anything resembling a novel, though the few actual scenes wedged between the notes are unmistakably Nabokovian, with cutting wordplay, piercing description and uneasy-making situations—a character named Hubert H. Hubert molesting a girl, a decaying old man’s strained attempt at perfunctory sex with his younger wife.

3 comentários:

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  2. É pena grande parte desse pessoal não ter o discernimento do Gogol que queimou quase toda a segunda parte do Almas Mortas numa notável desmonstração de higiene e sensatez.

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  3. Hmm, no caso de Gogol não foi só discernimento....aqui é antes o mal de as vontades dos herdeiros se sobreporem às disposições dos proprietários dos bens em questão, ainda ontem lia que os herdeiros do Kerouac andam a vender-lhe o espólio aos bocadinhos, quando tiveram ofertas milionárias para o venderem a uma única entendidade.Esta situação por acaso é bastante perversa, Nabokov era um génio, publicou da sua obra o que bem entendeu em vida, era tão genial que agora lhe andam a publicar mesmo o que ele não queria. Mas por esta lógica, não tinhamos o Livro do Desassossego do Pessoa, outro, que, acredite-se ou não,acho que publicou em vida o que queria publicar...enfim...é complicado. Por esta lógica também não tinhamos a Eneida do Vergílio, apenas dois ou três fragmentos de um poeta menor. Isto é conversa que nunca mais acaba. Já agora, aproveito para deixar os meus cumprimentos ao Máscara e Chicote. É um blogue que gosto de ler.

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