A primeira vez que li Montale foi no meu primeiro ano de Faculdade, no ano em que saiu a primeira edição da Assírio, em 2004, no mês de Dezembro, enquanto fazia a minha primeira cadeira de literatura, na altura Introdução ao Estudo da Literatura I, que já nem existe. Enumero aqui estes pormenores todos para fazer uma reflexão sobre a diferença entre uma primeira leitura e leituras seguintes.
A minha primeira leitura de Montale foi a leitura de alguém que não sabia muito de literatura italiana, que não tinha ainda lido autores da mesma geração, como Pavese ou Quasimodo, nem sequer autores de quem Montale se confessa devedor, como Dante. O que admirei em Montale numa primeira leitura foi a beleza evidente dos poemas, a beleza que entra pelos olhos e que nos ajuda a perceber que estamos perante um grande poeta. Poemas que incluo nesta categoria são poemas como «I limoni», «Vento e Bandieri», «Portami il Girasole», entre outros.
Numa segunda leitura, filtrada pela experiência de já ter lido outros autores próximos literariamente de Montale, como Pavese e Cernuda (que é um poeta que instintivamente agrupo na mesma categoria destes dois, embora não saiba porquê), entre outros, eu era já, digamos, uma leitora mais apta.
Para começar, numa segunda leitura, dei-me ao trabalho de ler a introdução de José Manuel Vasconcelos, que é excelente, e nos deixa melhor preparados para ler a selecção antológica por ele feita.
A sensibilidade de um leitor numa segunda leitura, parece-me, tende a ser mais paciente, mais atenta, e, ao mesmo tempo, mais descontraída. Nada nos pode devolver o encanto de ler um livro pela primeira vez, isso é certo. Mas tornamo-nos atentos a aspectos mais delicados, em que a forma como se trata a beleza ou o efeito estético ou a emoção que subjaz a determinado poema não é tão evidente.
Foi na minha segunda leitura de Montale que vi a beleza de poemas como «Lo sai: debbo riperderti e non posso», «Lontano, ero con te quando tuo padre», «Cigola la carrucola del pozzo», entre outros.
A minha experiência de vida permitiu-me ver melhor estes poemas, e não apenas a minha experiência de leitora. O que se aprende, à medida que se repete a leitura de determinado livro, é que os livros mesmo muito bons, aqueles que fazem do seu autor um grande autor, são aqueles que melhor admitem e resistem à nossa convivência, ao nosso olhar nem sempre educado para o que eles têm a oferecer, ao nosso escrutínio, às vezes não muito interessado na intensidade da emoção captada pelo sujeito poético de determinado poema, mas, cruelmente, apenas em efeitos de construção retórica, o que também é necessário, para averiguar da qualidade do fabbro que temos diante de nós. Montale sobrevive a tudo isso. A minha terceira leitura de Montale? Um dia conto-vos.
Há livros que nunca chegamos a ver completamente. Que nunca ficam revelados. Isso acontece por vezes apenas com grandes escritores, outras basta apenas que se trate de um grande livro. Há sempre algo que podemos tentar bargain (falta-me uma palavra melhor) com eles ou em relação a eles, eles superam-se e superam-nos sempre. É uma espécie de amor e uma espécie de eternidade, essa é uma das «utilidades» da literatura (já que vivemos num tempo em que nem ela pode ser inútil): ela desdobra o tempo e desdobra-se no tempo. É como a intuição maravilhosa de Maria Zambrano (em A Metáfora do Coração e Outros Escritos) nos explica: a palavra pára o tempo.
A minha primeira leitura de Montale foi a leitura de alguém que não sabia muito de literatura italiana, que não tinha ainda lido autores da mesma geração, como Pavese ou Quasimodo, nem sequer autores de quem Montale se confessa devedor, como Dante. O que admirei em Montale numa primeira leitura foi a beleza evidente dos poemas, a beleza que entra pelos olhos e que nos ajuda a perceber que estamos perante um grande poeta. Poemas que incluo nesta categoria são poemas como «I limoni», «Vento e Bandieri», «Portami il Girasole», entre outros.
Numa segunda leitura, filtrada pela experiência de já ter lido outros autores próximos literariamente de Montale, como Pavese e Cernuda (que é um poeta que instintivamente agrupo na mesma categoria destes dois, embora não saiba porquê), entre outros, eu era já, digamos, uma leitora mais apta.
Para começar, numa segunda leitura, dei-me ao trabalho de ler a introdução de José Manuel Vasconcelos, que é excelente, e nos deixa melhor preparados para ler a selecção antológica por ele feita.
A sensibilidade de um leitor numa segunda leitura, parece-me, tende a ser mais paciente, mais atenta, e, ao mesmo tempo, mais descontraída. Nada nos pode devolver o encanto de ler um livro pela primeira vez, isso é certo. Mas tornamo-nos atentos a aspectos mais delicados, em que a forma como se trata a beleza ou o efeito estético ou a emoção que subjaz a determinado poema não é tão evidente.
Foi na minha segunda leitura de Montale que vi a beleza de poemas como «Lo sai: debbo riperderti e non posso», «Lontano, ero con te quando tuo padre», «Cigola la carrucola del pozzo», entre outros.
A minha experiência de vida permitiu-me ver melhor estes poemas, e não apenas a minha experiência de leitora. O que se aprende, à medida que se repete a leitura de determinado livro, é que os livros mesmo muito bons, aqueles que fazem do seu autor um grande autor, são aqueles que melhor admitem e resistem à nossa convivência, ao nosso olhar nem sempre educado para o que eles têm a oferecer, ao nosso escrutínio, às vezes não muito interessado na intensidade da emoção captada pelo sujeito poético de determinado poema, mas, cruelmente, apenas em efeitos de construção retórica, o que também é necessário, para averiguar da qualidade do fabbro que temos diante de nós. Montale sobrevive a tudo isso. A minha terceira leitura de Montale? Um dia conto-vos.
Há livros que nunca chegamos a ver completamente. Que nunca ficam revelados. Isso acontece por vezes apenas com grandes escritores, outras basta apenas que se trate de um grande livro. Há sempre algo que podemos tentar bargain (falta-me uma palavra melhor) com eles ou em relação a eles, eles superam-se e superam-nos sempre. É uma espécie de amor e uma espécie de eternidade, essa é uma das «utilidades» da literatura (já que vivemos num tempo em que nem ela pode ser inútil): ela desdobra o tempo e desdobra-se no tempo. É como a intuição maravilhosa de Maria Zambrano (em A Metáfora do Coração e Outros Escritos) nos explica: a palavra pára o tempo.
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