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quinta-feira, 11 de abril de 2013

Zbigniew Herbert, «Calígula»


Lendo velhas crónicas, poemas e vidas, o Sr. Cogito experimenta por vezes uma sensação de presença física de pessoas há muito falecidas

Diz Calígula:

de entre todos os cidadãos de Roma
amei apenas um
Incitato – o cavalo

quando entrou no senado 
a irrepreensível toga do seu pêlo
brilhava imaculadamente entre covardes assassinos orlados de púrpura

Incitato era só virtudes
nunca discursava
natureza estóica
creio que de noite no estábulo lia os filósofos

ameio-o tanto que um dia resolvi crucificá-lo
mas a sua nobre anatomia não o permitiu

aceitou com indiferença a dignidade de cônsul
exercia a autoridade da melhor forma possível
isto é não a exercia de todo

não se pôde convencê-lo a manter relações amorosas estáveis
com a minha querida esposa Cesónia
e assim tristemente não surgiu uma linhagem de Césares-centauros

por isso Roma caiu

decidi proclamá-lo um deus
mas no nono dia antes das calendas de Fevereiro
Quereia Cornélio Sabino e outros idiotas frustraram as
minhas piedosas intenções

recebeu com tranquilidade a nova da minha morte

expulsaram-no do palácio e condenaram-no ao exílio

suportou este golpe com dignidade

morreu sem descendência
abatido por um rude açougueiro do lugarejo de Âncio

sobre o destino póstumo da sua carne
Tácito cala-se



Zbigniew Herbert
tradução de Izabela Stapor, José Pedro Moreira e Tatiana Faia
ítaca 3, Lisboa, 2012

Ver e descarregar os poemas de Herbert traduzidos na ítaca aqui.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Agio: Cadernos de ideias, textos & imagens

A partir de Janeiro, será possível acompanhar aqui o blogue da revista Agio – Cadernos de Ideias, Textos e Imagens. Esta revista resulta da junção de duas outras: a Agio e a Ítaca.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Nem tudo sobre Ítaca é silêncio

Ítaca

Graças a mãos amigas, pude ler Ítaca, revista fundada no decurso de 2009, por três investigadores do centro de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Os nomes: André Simões, J. P. Moreira e Tatiana Faia. Apaixonante leitura, além da qualidade da poesia como se hoje tudo fosse poema. Outros textos com imensa curiosidade, de como desenhar o mapa-mundi da minoria que existe e pensa e que por isso escreve e cria.
Falei de gravuras? Em geral tudo altamente inspirado e que inspira.


Jorge Listopad in Jornal de Letras, Ano XXXI, Número 1069 (De 21 de setembro a 4 de outubro de 2011).

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Ítaca 3: Um Poema

Te Deum, Vera Lynn (We'll meet again)

O passado de um deus é a eternidade feita
peso, invenção: as flores no meu jardim
eram seres acabados, perfeitos, finais,
antes de eu as semear. Mais: o vaso de esmalte,
lascado na base — vê-lo ali — é a
recordação de um dia, a sua história é
exactamente como a minha. Tal é o enredo
de certas flores, que ainda tingem o plano
e insistem no seu cheiro mesmo depois.

Simão Valente

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Ítaca 3: Um Poema

IV

Nós, os que nunca fomos sereias,
embarcamos em pequenas naus de regresso.
Somos imensos como a sombra vaga
no bosque sugerido pelo rasto dos montes,
de peito erguido ao infinito deste lugar.
E nossos filhos? Se aqui morrermos,
se aqui tivermos outro sítio que não a espera
seremos amados na memória do que não fomos.
Será tão breve a perfeição como é breve
a terra que se abre para o cadáver,
estar morto sempre foi vantagem
para quem sonha a eternidade. Não estamos juntos às ondas,
não choramos, a areia não faz tempo no relógio
nem a praia tem anos para gastar.
Melhor será vivermos na memória
do que neste corpo indizivelmente absurdo:
a mulher que nos amou terá no nosso enterro
a mais pura das razões para amar —
nunca contará com nosso regresso.
E abandonados somos voluntários náufragos
na esperança de morrermos cedo,
como um herói destinado, um mártir indecente,
uma cruz levantada entre o cais que nos deixam
e aquela ilhota obscena de estranha gente
que teima em não saber quem somos,
esses pequenos homens infelizes e convencidos
de que nós, depois de mortos, os recordaremos.

Pedro Braga Falcão

terça-feira, 12 de julho de 2011

Ítaca 3: Um Poema

Nada nos salva

Quase óbvio o preto
e branco na fotografia
de uma cidade assim. Lisboa,
à hora vaga de mais uma hora,
está entre a espera e a aparente
beleza firme das madrugadas;
Lisboa é também a merencória
herança da noite, precisamente
o modo como o crânio, curvado
e moroso, dormente ainda,
se molda à mão. Esta porra
triste que amamos.

José Salema

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Ítaca 3: Um Poema

III Aquiles e a Tartaruga
NATHANIEL FISCHER: How’s life?
CLAIRE FISCHER: How’s death?
NATHANIEL FISCHER: It’s good. Made some new friends, joined the
chess team.

Six Feet Under 3:13

para Victor Gonçalves


farto da aporia dos cem metros filosóficos Aquiles
desafiou a tartaruga
para uma partida de ténis

a princípio os pés velozes de Aquiles
a torrente irrefreável do seu amor
e um jogo eficaz de serviço-rede
pareciam ensinar a prevalência da paixão
sobre a paciência a meio
do primeiro set por pouco um smash
não decapitou a tartaruga

discípula de Platão Montaigne Nietzsche Derrida
companheira de copos de um grupo de filósofos paisagistas
e exegeta de David Lynch nas horas vagas
a tartaruga seguiu fielmente
a estratégia previamente definida
controlando o ritmo da respiração
decompunha o tempo em subtis fatias de presente
presente-quase-passado e presente-quase-futuro
uma sucessão simultânea de imagens
achando assim o kairos o momento exacto
em que a raquete deve encontrar bola

aplaudia as virtudes do adversário
enquanto desenhava o mapa dos seus vícios
das suas próprias virtudes cultivava somente
as que fossem suas aliadas na guerra
contra os seus vícios

assim
no final do sétimo set
jogavam à melhor de vinte e cinco
a tartaruga ultrapassou Aquiles

a partir daqui
o coração de Aquiles começa a rodopiar
cada vez mais rápido num maelstrom de desespero
sucedem-se erros não forçados duplas faltas
os pequenos descuidos que
como comprovam as leis do ténis
inutilizam toda a beleza

a partida terminou
quando Aquiles desfez a raquete contra o solo
isto valeu-lhe a desqualificação
e o ressentimento dos deuses

por isso
viu-se forçado a desposar Hebe
a solteirona do Olimpo
e a suportar nos Campos Elísios uma vida conjugal
para a qual não tinha qualquer vocação
a embriaguez as lágrimas os exercícios de lira
a que se entregou não lhe ofereciam consolo
só ensombravam ainda mais a sua sombra
nem as visitas ocasionais o animavam
no céu a noite não divide os dias
as almas não dormem
insones vagueiam de prazer em prazer
atormentados pela dúvida
se sonham ou não

foi num estado de profunda prostração
que a tartaruga achou Aquiles
alegrou-o o reencontro
recordaram os bons velhos tempos
Aquiles fez-lhe uma visita guiada
aos acomodamentos eternos
quando terminou fitou-a sombriamente
isto não é vida para ninguém

começou assim
um novo período das suas mortes
dedicaram-se ao xadrez
a tartaruga ganhava sempre
a princípio Aquiles encolerizava-se
arremessava as peças esculpidas em corno inquebrável
com o tempo descobriu os prazeres da indiferença
o seu jogo melhorou consideravelmente
mas nem por isso deixou de perder

quando querem descansar do xadrez
a que se entregam meses a fio sem interrupção
Aquiles e a tartaruga peripatetizam
discorrem sobre o sentido da morte
sobre a possibilidade do suicídio da alma
e acabam sempre por voltar ao xadrez

J.P. Moreira

quarta-feira, 22 de junho de 2011

"Porquê os Clássicos": Herbert, Ítaca, bolinhos polacos e vinho

As fotografias da sessão de poesia dedicada a Zbigniew Herbert (FLUL, 21.6.'11) já se encontram disponíveis aqui.

domingo, 19 de junho de 2011

Porquê os Clássicos?



















Na próxima terça-feira, pelas 19:00, estaremos no Anfiteatro 2 da F.L.U.L. para falar um pouco sobre as traduções de Herbert publicadas neste número da Ítaca. Apareçam. Clicar para aumentar a imagem.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

De uma sessão em que apresentaremos o n.º2 da Ítaca e falaremos um pouco do 3 (que está quase quase)

Esta apresentação será integrada no Evento «Solar» que está a decorrer em Torres Vedras, entre 23 e 26 de Fevereiro. Mais informação aqui.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ítaca, n.º2


Algumas considerações sobre como chegar a Ítaca

1. Dirija-se a uma das livrarias indicadas na lista escondida pelo link acima, tire a Ítaca da estante e/ou pilha de livros onde estiver (se não houver pilha de livros pergunte ao/à livreiro/a [lembre-se: se a livraria está na lista, a Ítaca tem de estar na livraria!]), avance resolutamente até ao balcão segurando firmemente Ítaca. Proceda à troca comercial com o/a livreiro/a: dê-lhe, na divisa que ele/a estiver disposto/a a aceitar (muito provavelmente o euro), o valor indicado no autocolante colado na contracapa e/ou escrito a lápis na folha de rosto do exemplar de Ítaca que escolheu para si. Se lhe for possível não aceitar o saco de plástico (ou papel) que o/a livreiro/a em seguida lhe tentará oferecer, seja amigo do ambiente: guarde Ítaca na sua mala, bolsa, bolso (depende do tamanho do bolso) ou mochila. 
2. O que acontece em seguida escapa ao âmbito destas instruções. 
3. Se seguiu estas instruções, saiba que acaba de comprar um objecto potencialmente perigoso, a um nível geral designado como livro mas mais especificamente denominado Ítaca. O que este objecto contém no seu interior e o que lhe poderá fazer, ninguém sabe. Os efeitos, depois de lido, variam de pessoa para pessoa e, regra geral, nunca são os mesmos a cada leitura.
Livros: nunca ficam sem bateria e estarão sempre à sua espera no ponto onde os deixar.

 Ítaca é um livro*. Mas é também um lugar.

*Poderá conter no seu interior vestígios de café, aparas de tabaco Amsterdamer, réstias de bolachinhas e um persistente cheiro a maçã e canela. De um modo geral, porém, é feita de ideias, textos & imagens.

domingo, 24 de outubro de 2010

Ítaca, n.º 2

A todos os que ontem estiveram presentes no lançamento da Ítaca e encheram as salas da Livraria Fábrica Braço de Prata, a todos os que divulgaram o lançamento, a todos os que connosco fazem e acreditam neste projecto: muito obrigada.
Mais novidades em breve...