quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Bazárov

A primeira vez que peguei em Turguéniev foi para ler Pais e Filhos na tradução de António Pescada, publicada pela Relógio d'Água e saída em Maio de 2007. Sei que a li em Agosto desse mesmo ano porque tenho a mania de escrever nos livros a data em que os li. Olho para o livro na estante e lembro-me vagamente do argumento, que não é o mais importante. Do que eu me lembro bem é da personagem de Bazárov. Quando comprei o livro, o que mais me impressionou foi a citação do posfácio que vem na contracapa.
Em Agosto de 2007 creio que queria ler um livro em que existisse isso mesmo que Nabokov lá apregoa: uma personagem que pudesse ser o que quisesse, livre de introspecção mas que não fosse uma marioneta. É muito difícil criar uma personagem que não se torne um joguete das restantes se o narrador não nos der de alguma forma acesso aos seus pensamentos. Lembro-me bem desse aspecto do livro, só muito vagamente me recordo de ter tido acesso ao que Bazárov pensa ou sente.
Bazárov: um jovem com um potencial infinito, que podia ter sido o que quisesse. Um médico famoso, um revolucionário, um agitador social, um pensador, qualquer coisa. Tudo isso fica em suspenso. Bazárov podia ter sido tudo isto mas estanca no vazio. (Se ainda não leu livro, não leia a partir daqui, eu conto o final.)
Turguéniev inventou um homem com um potencial infinito, para ele morrer antes de chegar aos vinte. Corta-se ao tratar um doente com tifo e não tem como cauterizar a ferida. Deste ponto de vista, a obra encerra de certa forma uma metáfora: não podes ser tudo se não tiveres como te disciplinar, não te podes deixar ferir pela vida se não souberes como cauterizar a ferida. Sempre achei que era isso que passava pela cabeça de Bazárov durante a sua lenta agonia.

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