"The Shape of Time" é um artigo de 2004, da autoria de Peter Brooks sobre Em Busca do Tempo Perdido de Marcel Proust, publicado no New York Times. O artigo versa em parte sobre a problemática da tradução de Proust para inglês, e o autor fala-nos de diferentes traduções e da qualidade de cada uma, revisitando a história da tradução desta obra para língua inglesa. Impressionou-me a ideia de Cambridge ter feito uma tradução da obra em que cada volume é traduzido por um autor diferente. Acho que isso não resulta, embora traga diversidade de soluções e pluralidade de vozes. Se fossem livros diferentes de um mesmo autor, talvez não me chocasse tanto, mas é apenas um romance, em sete volumes. Foi escrito por uma só pessoa, creio que deve ser traduzido por uma só pessoa. É uma questão de garantir, tanto quanto possível, coerência de estilo e unidade. Em Portugal, Pedro Tamen traduziu, para a Relógio d'Água, todos os sete volumes e fez, sem dúvida, um bom trabalho. Por ex., percebemos na sua tradução o longo fôlego que Proust dava aos seus períodos, é característico de Proust, e Tamen conservou esta característica. Nestes pormenores, é possível avaliar a qualidade do tradutor.
Há outros casos de tradução para português que acho igualmente notáveis, como, por exemplo, o trabalho que Frederico Lourenço realizou na sua tradução de Homero (Livros Cotovia), ele traduziu quer a Odisseia quer a Ilíada e considero isso positivo, dota de uma certa consonância as obras, apesar de não sabermos se Homero existiu e se foi apenas um, e, em qualquer dos casos, ele é um tradutor extraordinário. A qualidade da sua tradução advém-lhe, segundo me parece, de um domínio irrepreensível quer da língua de partida quer de chegada, e de não de estar demasiado preocupado em render ao leitor para quem traduz os detalhes da sintaxe grega (se ali temos um genitivo absoluto, ou um caso de uso de particípio suplementar, etc., etc.) mas sim (e sobretudo) a beleza e o sentido do texto grego, buscando os seus equivalentes em português mas mantendo-se fiel à língua de partida.
Outra tradução de um clássico que assinalo como excelente é o trabalho que Paulo Farmhouse Alberto fez, também para a Livros Cotovia, das Metamorfoses de Ovídio. O tradutor fez uma tradução bastante fiel ao latim mas nunca se descurou em relação à língua de chegada. O resultado, para mim, está ao nível do trabalho de Frederico Lourenço na Ilíada e na Odisseia.
Nos antípodas, e não por falta de qualidade dos tradutores, está a tradução da Eneida da Bertrand. É a única tradução portuguesa desta obra que é cientificamente correcta (e que eu conheço, à parte da de Agostinho da Silva), porque é actual e feita a partir da língua original, contudo, num texto que já de si é por natureza intraduzível (como render a beleza de trechos como Ibant obscuri sola sub nocte per umbram?), a juntar a isto, a tradução não ficou confiada a apenas um tradutor e não é em verso. O que estilhaça a beleza de um texto que já de si é muito problemático de traduzir. Ideal seria que a Livros Cotovia contratasse Pierre Ménard para que ele traduzisse para português a obra maior de Vergílio.
Deixo-vos um excerto, link incluído, do artigo sobre Proust:
Há outros casos de tradução para português que acho igualmente notáveis, como, por exemplo, o trabalho que Frederico Lourenço realizou na sua tradução de Homero (Livros Cotovia), ele traduziu quer a Odisseia quer a Ilíada e considero isso positivo, dota de uma certa consonância as obras, apesar de não sabermos se Homero existiu e se foi apenas um, e, em qualquer dos casos, ele é um tradutor extraordinário. A qualidade da sua tradução advém-lhe, segundo me parece, de um domínio irrepreensível quer da língua de partida quer de chegada, e de não de estar demasiado preocupado em render ao leitor para quem traduz os detalhes da sintaxe grega (se ali temos um genitivo absoluto, ou um caso de uso de particípio suplementar, etc., etc.) mas sim (e sobretudo) a beleza e o sentido do texto grego, buscando os seus equivalentes em português mas mantendo-se fiel à língua de partida.
Outra tradução de um clássico que assinalo como excelente é o trabalho que Paulo Farmhouse Alberto fez, também para a Livros Cotovia, das Metamorfoses de Ovídio. O tradutor fez uma tradução bastante fiel ao latim mas nunca se descurou em relação à língua de chegada. O resultado, para mim, está ao nível do trabalho de Frederico Lourenço na Ilíada e na Odisseia.
Nos antípodas, e não por falta de qualidade dos tradutores, está a tradução da Eneida da Bertrand. É a única tradução portuguesa desta obra que é cientificamente correcta (e que eu conheço, à parte da de Agostinho da Silva), porque é actual e feita a partir da língua original, contudo, num texto que já de si é por natureza intraduzível (como render a beleza de trechos como Ibant obscuri sola sub nocte per umbram?), a juntar a isto, a tradução não ficou confiada a apenas um tradutor e não é em verso. O que estilhaça a beleza de um texto que já de si é muito problemático de traduzir. Ideal seria que a Livros Cotovia contratasse Pierre Ménard para que ele traduzisse para português a obra maior de Vergílio.
Deixo-vos um excerto, link incluído, do artigo sobre Proust:
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