(Lines written in dejection)
Aos dezoito anos vive-se já na antecâmara
do pesadelo, mas a vida reserva-nos ainda
o fulgor intempestivo dum embate
donde sairemos homens, estonteados
de suor e lama.
Sabíamos que não iria durar muito
a juventude - noventa e três minutos,
se não erro. Mas o trevo permanece
nas pastagens da memória: um irónico
toque de calcanhar, uma rápida investida
no coração do tempo, as mais loucas
diagonais contra o pior dos fatalismos,
o dos tímidos.
Como esquecer aquelas fintas à tristeza,
a viva fantasia dos relâmpagos abrindo
fundas brechas no espírito simétrico,
pesado, dos teutónicos, a negação
do fado. Que foi isto, perguntámos,
como pôde? Nenhum relógio mede
tamanha velocidade.
E as lágrimas deslizam, como vêem,
pelo poema abaixo, isso é sinal de que o futuro
já passou, já ruiu a balaustrada de onde víamos,
serenos, a corrida dos minutos, coroada
de possível. Que nos resta? Nada. Felizes
os que guardam, pelo menos, a cassete.
José Miguel Silva, Movimentos no Escuro, Assírio & Alvim, 2005
Note-se que resisti à tentação de acompanhar o poema com um vídeo do golaço de calcanhar do Madjer. Quem me conhece sabe quanto isso me custou.
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