segunda-feira, 20 de julho de 2009

Epígrafe para a arte de furtar

Roubam-me Deus,
outros o Diabo
- quem cantarei?

roubam-me a pátria;
e a Humanidade
outras ma roubam
- quem cantarei?

sempre há quem roube
quem eu deseje;
e de mim mesmo
todos me roubam
- quem cantarei?

roubam-me a voz
quando me calo,
ou o silêncio
mesmo se falo
- aqui del-rei!

Jorge de Sena, Fidelidade, 1958.


A Arte de Furtar, a partir da qual Jorge de Sena escreveu esta «Epígrafe», é uma obra actualmente atribuída ao jesuíta Manuel da Costa, o título é algo irónico, uma vez que, em traços muito gerais, é uma obra sobre política, e inscreve a obra na tradição de obras didácticas que foram publicadas em Portugal no séc. XVII. Em relação ao poema de Jorge de Sena, é sobre ser roubado, temática que surge em vários outros passos da poética de Jorge de Sena (veja-se por exemplo o poema «Camões dirige-se aos seus contemporâneos»), e liga-se à íntima revolta que Sena sentia por nunca lhe ter sido reconhecido o devido espaço e importância que realmente merecia ocupar enquanto escritor entre os seus contemporâneos.
Ainda sobre furtar, sendo este blogue, em primeiro lugar, um espaço de partilha e divulgação de e sobre literatura, não nos importamos de ver algumas das coisas de que por aqui se fala e textos ou partes de textos que aqui se transcrevem em copy paste noutros blogues, pelo contrário, uma vez que se trata de um indício de que o que aqui escrevemos entusiasma os nossos leitores e tem afinidades com o que eles próprios pensam e gostam de ler. No meu caso particular creio, contudo (uma vez que trabalhar cansa e nós tiramos um pouco do nosso pouco tempo livre para alimentar este blogue), que é justo que por isso nos seja dado o devido crédito.

Sem comentários:

Enviar um comentário