«Entre as mais notáveis características do espírito humano», diz Lotze, «conta-se…, no meio de tantas formas particulares de egoísmo, a ausência generalizada de inveja de cada presente em relação ao seu futuro». Esta reflexão leva a que a imagem da felicidade a que aspiramos esteja totalmente repassada do tempo que nos coube para o decurso da nossa própria existência. Uma felicidade que fosse capaz de despertar em nós inveja só existe no ar que respiramos, com pessoas com quem pudéssemos ter falado, com mulheres que se nos pudessem ter entregado. Por outras palavras: na ideia que fazemos da felicidade vibra também inevitavelmente a da redenção. O mesmo se passa com a ideia do passado de que a história se apropriou. O passado traz consigo um index secreto que remete para a redenção. Não passa por nós um sopro daquele ar que envolveram os que vieram antes de nós? Não é a voz a que damos ouvidos um eco de outras já silenciadas? As mulheres que cortejamos não têm irmãs que já não conheceram? A ser assim, então existe um acordo secreto entre as gerações passadas e a nossa. Então, fomos esperados sobre esta Terra. Então, foi-nos dada, como a todas as gerações que nos antecederam, uma ténue força messiânica a que o passado tem direito.
Walter Benjamin, O Anjo da História: Obras Escolhidas de Walter Benjamin, João Barrento (ed. & trad.), Assírio & Alvim, Lisboa, 2010
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