sábado, 15 de janeiro de 2011

É toda a gente açaimada ficar em suspenso

A nossa língua não possui palavras que permitam dosear o grau de realidade, definir-lhe o peso. Digamo-lo sem nenhum véu: a fatalidade deste bairro é nada haver nele que se realize, é toda a gente açaimada ficar em suspenso, esgotar-se prematuramente sem conseguir ultrapassar certos limites. Tivemos ocasião de referir a exuberância e a prodigalidade das intenções, dos projectos e das antecipações. Não passavam de uma fermentação precoce, e portanto estéril, de desejos.
(...) Vamos envolver-nos em confusões intermináveis até a nossa febre e a nossa emoção se esgotarem, gastas por esforços inúteis, por uma vã procura.

Bruno Schulz, As Lojas de Canela*, Tradução de Aníbal Fernandes, Assírio & Alvim, 1987.

*Este livro foi-me recomendado por um futuro grande escritor (impressão que, dizem fontes não identificadas, terá experimentado António Lobo Antunes ao apertar-lhe a mão -- o grande escritor ainda não terá conseguido livrar-se dessa impressão), André Rodrigues. É um belo livro. Sobretudo dois contos, «As Lojas de Canela» e «A Rua dos Crocodilos». Não me apetece explicar agora o porquê de destacar estes dois contos e não outros quaisquer. Fica para outro dia.

2 comentários:

  1. o livro do Pietro Citati "Israel e o Islão: As Centelhas de Deus" tem um capítulo sobre este senhor que me deixou com franca vontade. agora sois dois quem mo sugere. odeio a literatura.

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  2. é uma praga, é o que te digo, basta ler um e quando dás por ti vêm infinitos atrás.

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