domingo, 14 de fevereiro de 2010

O segredo

Entraste na noite
pelo lado da solidão.
A ela contas que sais com eles
a eles que sais com ela.
Encaminhas o velho Renault 4
para certo lugar desabitado
da cidade.
Fizeste entrar um corpo,
acenderam um cigarro enquanto
procuras um retiro pelas sombras.
Silencias a sua voz quando quer falar-te,
com um gesto decides
forma de desejo.
Entraste num corpo
pelo lado da solidão.
Por um instante sentiste-te bem
mas não o dizes,
embora não consigas reprimir
uma carícia no vidro embaciado.
Atrás da porta que fechou deixa-te
um rastro de perfume ignóbil
que aspiras com deleite:
como o símbolo o queres
para quando queimar a claridade
da manhã.

José Ángel Cilleruelo, Antologia, Joaquim Manuel Magalhães (trad.), Averno, 2005

1 comentário:

  1. Poema do lado errado da noite. Quando estacionamos a vida em contramão num beco sem saída, para respirar.

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