Era miúda quando comecei a ler livros. Sete ou oito anos, à volta disso. Mas acho que só nos começamos a tornar leitores uns anos mais tarde. Tinha uma amiga que me dizia que tinha lido todo o Faulkner aos onze anos, todo o Dostoiévsky entre os treze os dezasseis. Este é um caso excepcional mas também não me parece um bom exemplo para aquilo que seria a formação de um leitor regular. Não sei qual a utilidade de uma criança ler O Som e a Fúria aos onze anos. Aos vinte e dois acredito que muita coisa me tivesse escapado. Muitíssima mesmo.
De um livro guardamos o que nos impressiona e o que nos impressiona é regra geral aquilo que é muito próximo da nossa experiência de vida à data. O que há em O Som e a Fúria que pudesse levar uma criancinha a identificar-se com ele? Estou em crer que quase nada. Há pouco estava a ler este artigo.
Dar livros infantis a miúdos de famílias com rendimentos escassos. Isto parece um pouco fora do âmbito daquilo para que a minha argumentação parece estar a inclinar-se, mas não é. As nossas escolas não formam bons leitores e não sei porquê (sobre este assunto cf. o aluno mediano de Letras, onde por definição deviam estar os leitores, os leitores profissionais se assim quiserem e o que quer que isso seja, e perguntar-lhe que último livro leu e o que achou dele). É urgente criar um potencial de imaginação, desenvolvê-lo atentamente e de forma inteligente e orientada. Estou em crer que a imaginação é o capital que nos resta, para não dizer a última coisa infinita. Quando até nisso se falha...
De um livro guardamos o que nos impressiona e o que nos impressiona é regra geral aquilo que é muito próximo da nossa experiência de vida à data. O que há em O Som e a Fúria que pudesse levar uma criancinha a identificar-se com ele? Estou em crer que quase nada. Há pouco estava a ler este artigo.
Dar livros infantis a miúdos de famílias com rendimentos escassos. Isto parece um pouco fora do âmbito daquilo para que a minha argumentação parece estar a inclinar-se, mas não é. As nossas escolas não formam bons leitores e não sei porquê (sobre este assunto cf. o aluno mediano de Letras, onde por definição deviam estar os leitores, os leitores profissionais se assim quiserem e o que quer que isso seja, e perguntar-lhe que último livro leu e o que achou dele). É urgente criar um potencial de imaginação, desenvolvê-lo atentamente e de forma inteligente e orientada. Estou em crer que a imaginação é o capital que nos resta, para não dizer a última coisa infinita. Quando até nisso se falha...
É uma questão muito complexa. Se por um lado é verdade que os programas são maus - demasiadamente centrados numa maioria/mediania que eu ainda não percebi bem o que é -; por outro lado, temos professores desmotivados, maus professores (e bons que também os há) e toda uma sociedade (de alunos) que crescem com o facilitismo, a instantaneidade, dos jogos do computador, do entretenimento da televisão.
ResponderEliminarLer, de resto como escrever, é um excercício de músculo, dedicação, tempo, paciência. Coisas muito remotas, coisas que dizem muito pouco, quase nada, a determinada geração, parece-me.
Jinhos.
Olá Tatiana , foi bom teres-te lembrado disto . O meu João - que vai fazer nove - já anda a ler o R.L. Stevenson e o Daniel Ddefoe , tenho por hábito pôr-lhe os livros à frente , mas faço-o sem metodologia ... Onde a buscar ? - já passou o tempo de lhe ler as histórias da Sherezade ou as aventuras do gigante Pantagruel...
ResponderEliminarAinda sobre a autonomização ( e os progressos da leitura ) , foram tantas as coisas que eu li com 12,13,14 e que só ganharam sentido numa releitura . Teria sido tempo perdido ?
ResponderEliminareu também acho que é uma questão complexa, mesmo a questão do método (que método utilizarei eu quando tiver um miúdo, S.T.?) Espero que ler e escrever ainda venha a dizer alguma coisa à próxima geração, Joana, sobretudo porque acho que eles têm, como nós já temos um pouco, uma brutal facilidade de acesso a informação, que infelizmente depois também constitui ruído e que será preciso aprender a isolar. Mas mentia se te dissesse que não vejo uma disponibilidade de imaginação semelhante em jogos de computador, são objectos próximos, embora diferentes. Acho que o processo de releitura faz parte (mas voltamos porque as coisas já na altura nos disseram alguma coisa, porque gostámos delas). Maus professores ajudam a não formar leitores, mas também casas onde não há um único livro e a definição de ocupação para um pai é pôr o filho em frente à televisão e siga. Tudo isto devia ser pensado cuidadosamente. Teremos espaço para isso e meios?
ResponderEliminarAcho que "omnia tempus habent", como dizia o outro. Se hoje sou um leitor compulsivo foi graças aos livros infantis e juvenis ("Os Cinco", "Os Sete", Verne, ficção científica da Argonauta...) que devorei em quantidades desesperadoramente industriais para a minha mãe, que tinha de os comprar.
ResponderEliminarTambém li Darwin com 9 ou 10 anos, lia enciclopédias com 7 ou 8, e foi a Odisseia adaptada pelo João de Barros e uma colecção de mitos gregos que li, em miúdo, que me fez estudar Clássicas. Mas o fundo literário que me preparou para os Joyce, Tolstói, Dostoiévski, Proust e outros foram mesmo os livros infantis e juvenis. Dificilmente teria entrado no Eça ou no Eco ou no Lobo Antunes se não tivesse lido primeiro Enid Blyton, quando estava na primária, ou Philip K. Dick, no início da adolescência.
Como dizia já não sei quem, desconfio sempre de quem não inclui nos grandes livros da sua vida pelo menos meia dúzia de livros infantis ou juvenis.
De qualidade, evidentemente.
Eu não tenho filhos, e só um cataclisma apocalíptico, um daqueles sinais dos tempos é que poderia mudar esta panorama, mas tenho os meus sobrinhos, que são quase como se fossem meus filhos, pois estão comigo diariamente, e nos 3 anos de dispensa de serviço estava com eles várias horas por dia, o que coincidiu com a sua aprendizagem da fala.
Leio-lhes histórias desde o tempo em que mal falavam ainda (têm hoje 4 e 5 anos), diariamente. Mas só lhes dou e leio livros de qualidade. Leio-lhes também poesia para crianças, mas de qualidade, como Pessoa (sim, tem poemas para crianças) ou cancioneiro popular. Selecciono poemas com ritmo marcado, com aliterações ou assonâncias evidentes, e eles gostam. As histórias são simples, mas com vocabulário rico. De resto sempre tive como ponto de honra não usar "baby talk" com eles, e "carro" foi sempre "carro", nunca "popó", e "gato" sempre "gato", "vaca" sempre "vaca". A Carolina dizia "autocarro" perfeitamente com um ano, e quando tinham 2/3 anos ficaram muito indignados um dia quando apontei para uma turbina eólica e disse "olha um moinho". Corrigiram logo em coro "é uma turbina!!!!".
E eles têm já um gosto acentuado por livros, como objecto físico, e curiosidade pelas letras, enquanto signo. E sobretudo desde os 2/3 anos têm um fascínio por livrarias e bibliotecas, tendo mesmo havido tempos em que faziam birra para os levar "à woja dos wivros", e faziam birras ainda maiores quando tínhamos de ir embora. Não são mais inteligentes do que os outros. A exposição continuada tem destas coisas.
Quanto ao ensino, quando são os próprios professores e futuros professores de português que muitas vezes não gostam de ler, acho que estamos conversados. E eu já fui professor do básico, do secundário (2 anos) e da universidade (há 15 anos), e já dei formação a professores, sei bem do que falo.
...e depois , tem que haver de facto uma propensão , um enamoramento , uma descontrolada curiosidade sobre as coisas , são cinco que perfazem o meu bando e desde pequenos que intuí os que por toda a vida , como eu , não se desafeiçoariam de ler . ( no momento em que escrevo , uma pré-adolescente desceu com pézinhos de lã à terra - para vir almoçar - e afastou-se - ó pasmo- duas divisões da casa - da página do facebook ... ).
ResponderEliminarNo mais ,no mais ... estammos todos em sintonia .
;-)
Mas tipos como vocês são excepção, e assim não dá para barafustar, lol.
ResponderEliminar