domingo, 31 de julho de 2011

O que há para compreender

         e a surpresa e o terror não no meu neto, em mim, a bomba da água do coração tão rápida e o que trazia eram restos de sapatos de um palhaço afogado, imaginei que um saxofone a seguir ao sapato e o saxofone dissolvido no fundo, conheço desconsolos nas coisas, não conheço nas pessoas e portanto não me queixo, o que é o desconsolo aliás, não tenho ocasião para me entristecer ou não há o espaço no meu peito que a tristeza requer apesar de eu vazio ou seja não vazio porque uma vela num castiçal antigo que a prima que tomava conta de mim plantava à cabeceira, uma palma na minha testa a garantir
         - Quando cresceres compreendes
           recordo-me de perguntar
         - O que há para compreender?


António Lobo Antunes, Sôbolos Rios Que Vão, D. Quixote, 2010.

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