segunda-feira, 18 de julho de 2011

XVII

Havia também o outro Judeu. Aquele que mais temias, o do shtetl, de Brooklyn, do lado errado da história, com o sotaque errado, da classe social errada. Aquele por que te deixei. Aquele que ao mesmo tempo era parecido contigo e não era parecido contigo, que ao longo dos anos te foi revelando perante mim, e que não se podia revelar a si próprio. Aquele que disse, como se tivesse memorizado a fórmula, Agora nada já nada resta, exceptuando a comida e o humor. Aquele que, como tu, acabou isolado, que se tentara mover no mundo flutuante dos assimilados, que sabem e negam que serão sempre estrangeiros. Que num carro alugado conduziu até Vermont e deu um tiro a si próprio. Durante tantos anos tinha pensado que tu e ele eram opostos. Por essa altura precisava da vossa dissemelhança; agora é a vossa semelhança que me olha no rosto fixamente. Existo algo mais para lá da comida, do humor, uma mudança na frase, um gesto das mãos: existe algo mais.

Adrienne Rich, Your Native Land, Your Life, Norton, 1993.

Versão minha.

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