Quando só uma visão mil vezes mais aguda do que a pode dar a natureza seria capaz de distinguir no oriente do céu a diferença inicial que separa a noite da madrugada, o almuadem acordou. Acordava sempre a esta hora, segundo o sol, tanto lhe fazendo que fosse verão como inverno, e não precisava de qualquer artefacto para medir o tempo, nada mais que uma mudança infinitesimal na escuridão do quarto, o pressentimento da luz apenas adivinhada na pele da fronte, como um ténue sopro que passasse sobre as sobrancelhas ou a primeira e quase imponderável carícia que, (continuem a ler por vós, que isto está na pág. 17)
José Saramago, História do Cerco de Lisboa, Caminho, 2008 (8ª edição).
Lobo Antunes tem um momento parecido com este, ao dizer, nem me lembro já onde, «acordo ao som da luz».
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