segunda-feira, 8 de março de 2010

Agora sou o meu cadáver, um corpo no fundo de um poço. Há muito que soltei o último suspiro, que o meu coração parou de bater, mas, excluindo o patife que me matou, ninguém sabe o que me aconteceu. Ele, porém, esse desprezível pulha, para se certificar de que tinha acabado comigo, prescrutou-me a respiração, vigiou as minhas últimas palpitações, depois deu-me um pontapé nas costelas, em seguida arrastou-me até à beira de um poço para me atirar por cima do parapeito. A minha cabeça, já partida à pedrada, rebentou ao cair no poço; a cara, a testa e as faces esmagaram-se, apagaram-se; os meus ossos partiram-se, a minha boca encheu-se de sangue.

Orhan Pamuk, O Meu Nome é Vermelho, Filipe Guerra (trad.), Editorial Presença, 2007.

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