a guerra daqui não mata - mas abre fissuras
nos nervos - é o que te posso dizer
deste país que escolhi para definhar
a cidade é um amontoado de lixo de tapumes
de sucata e de casas que se desmoronam
a realidade estragou os olhos das crianças
no fim do corpo em que me escondo espalhou-se
a treva onde
guardo a corola azulínea da tua ausência
e o marulho nítido de um mar que canta
e um calor sísmico nos lábios que beijaste
é-me difícil continuar a escrever-te
o que me destrói - sei que estou fodido
e tu já não és meu
preparo-me para entreabrir os olhos e
deixar escorrer a convulsão oleosa das lágrimas
e das coisas tristes
Al Berto, Horto de Incêndio, Assírio & Alvim, 1997
Sem comentários:
Enviar um comentário