A guitarra era um instrumento popular quando eu era jovem. Nesse tempo encontrava-se gente a tocar guitarra, sem grande jeito, em quase todas as esquinas de qualquer cidade. Alguns dos melhores tangos foram compostos por gente que não era capaz de os escrever nem de os ler. Mas era gente que tinha, claro, a música na alma, tal como Shakespeare teria dito. Portanto, ditavam esses tangos a alguém; eles eram tocados ao piano e eram escritos e publicados por gente letrada. Lembro-me de ter conhecido uma dessas pessoas, Ernesto Poncio. Escreveu Don Juan, um dos melhores tangos antes do tango ser estragado pelos italianos em La Boca (1) e por aí adiante - quer dizer, quando os tangos vinham dos criollos. Um dia ele disse-me: já estive na prisão muitas vezes, señor Borges, mas sempre por homicídio! Aquilo que ele queria dizer é que não era nem um ladrão nem um chulo.
(1)Bairro italiano em Buenos Aires, habitado por italianos oriundos de Génova.
Jorge Luís Borges em Entrevistas da Paris Review, Selecção e Tradução de Carlos Vaz Marques, Tinta da China, 2009
(1)Bairro italiano em Buenos Aires, habitado por italianos oriundos de Génova.
Jorge Luís Borges em Entrevistas da Paris Review, Selecção e Tradução de Carlos Vaz Marques, Tinta da China, 2009
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