sábado, 24 de outubro de 2009

Gruchnítski

É bastante espirituoso, muitas vezes os seus epigramas até têm alguma piada, mas nunca são certeiros e maldosos: nunca matará ninguém com simples palavras; não conhece os outros nem as cordas sensíveis das pessoas porque toda a vida se centra exclusivamente em si mesmo. O seu objectivo é tornar-se herói de um romance. Tantas vezes tentou convencer os outros de que era uma criatura que não foi criada para o mundo terreno e que estava condenada a não sei que misteriosos sofrimentos que acabou, ele próprio, por quase se convencer disso. É por isso que enverga com tanto orgulho o seu rude capote de soldado. Como percebi o que ele era, não gosta de mim, embora, aparentemente, tenhamos as mais amigáveis relações. Gruchnítski tem fama de valentão; vi-o em combate: brande o sabre, grita e atira-se para a frente de olhos franzidos. Aquilo não é mesmo nada a coragem russa!...

Mikhail Lérmontov, O Herói do Nosso Tempo, Nina Guerra e Filipe Guerra (trad.), Relógio d'Água, 2008.

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