Diz que D. João V gostava de fazer as coisas em grande. No que toca a embaixadas, ficou famosa a que enviou ao Papa Clemente XI, entre 1712 e 1718, encabeçada num primeiro momento por Rodrigo de Meneses, marquês de Fontes, e na recta final por André de Mello e Castro, que mais tarde seria conde de Galveias e Vice-Rei do Brasil.
But I digress. Convém só dizer que o Mello e Castro estava já em Roma antes mesmo de começar oficialmente a embaixada, como enviado especial, a tentar arranjar maneira de compensar o orgulho ferido do monarca - por não ter conseguido meter o bedelho diplomático na salganhada do rescaldo da Guerra da Sucessão Espanhola - com qualquer coisa jeitosa e que brilhasse, tipo a promoção da diocese de Lisboa a igreja patriarcal, o que a bem dizer dá sempre jeito. Algo assim.
But I digress. O essencial é que o tal Mello e Castro vivia ao pé da Piazza Argentina, actual Largo di Torre Argentina (nada a ver com o país, parece que vivia lá um mestre de cerimónias papal chamado Giovanni Burcardo -vá-se lá saber o nome verdadeiro do homem - que era de Estrasburgo, aka Argentoratum), onde há ainda hoje um certo Teatro Argentina (falta de imaginação).
But I digress. O que é mesmo importante é que parece que esse teatro só foi inaugurado em 1732 mas que antes havia aí alguma coisa vagamente reminiscente de um teatro. Ora, tendo em mente a má fama de tais casas por essa altura, sou capaz de começar a pensar que o pré-conde de Galveias era, afinal, um pândego, se tiver também em conta que o dito organizou uma série de festas e espétaculos na tal espécie de teatro pelos anos em que pedinchava um patriarcado ao papa.
But I digress. O busílis está no facto que sua Excelência o Enviado Especial quase Embaixador gostava de convidar os amigos todos para esses eventos - leia-se, tudo o que fosse português e se encontrasse em Roma ou lá perto - , naturalmente implicando-se uma borla. E mais: fazia saber por todos os meios possíveis a sua nobre e patriótica intenção. Era só aparecer à porta, explicar que se era português, e entrar.
O desfecho, como seria aliás de se prever, é que Roma no século XVIII revelou ter mais portugueses do que Paris em 69 ou Lisboa anteontem. Não invejo o porteiro que teve que aturar infinitos "ma' io sou potoghesh! Lisboa! Amália! Mourinho! Cucujães!" versão barroco tardio a resvalar para o neoclássico.
Um par de séculos depois, a expressão "fare il portoghese", em italiano corrente, quer dizer "entrar nalgum sítio sem pagar", ou em vernáculo do nosso: "ser penetra". Note-se, "fare il" tanto pode signicar "fingir ser" como "ter por profissão", como em "babbo fa il CEO di Microsoft". But I digress.
O que queria mesmo dizer é que um bocadinho de erudição poupa muito dinheiro no psiquiatra ou no bar da esquina quando se é um português que 1) vive em Bolonha 2) anda sempre de autocarro sem passe ou bilhete 3) lê isto no jornal local.
:-)))
ResponderEliminarMais estrondosa, literalmente, se menos espaventosa, foi a embaixada que D. João IV, recentemente empossado nesta choldra, enviou a Roma em 1641. Era D. Miguel de Portugal, bispo de Lamego, e a intenção era dizer ao papa Urbano VIII que os tugas tinham corrido com a espanholada, e que o novo rei lhe manifestava obediência.
ResponderEliminarUrbano VIII, todavia, apertado pelos espanhóis, recusou-se a receber a obediência portuguesa, e consequentemente não reconheceu a independência conquistada a 1 de Dezembro de 1640. Mesmo assim D. Miguel foi-se deixando ficar, e ao longo de 1641 e 1642 produziram-se dezenas de panfletos de um lado e do outro, a provar que devia ou não devia ser recebido. Em italiano mas sobretudo em latim. O papa, contudo, manteve-se amedrontadamente fiel a Espanha, e ignorou os tugas.
A espanholada, no entanto, não fosse dar um rebate de consciência ao papa, que podia vir sob a forma de um suborno real ou de outra cousa menos católica, fez uma espera a D. Miguel, já em 1642. Houve tiros, mortos e feridos. O embaixador português escapou. Mas o papa não se comoveu.
D. Miguel foi-se embora sem ser recebido, e essa foi apenas a primeira humilhação diplomática portuguesa. Poucos anos depois, D. Nicolau Monteiro, prior de Cedofeita, foi a Roma, embora sem ser oficialmente embaixador. Ainda assim também ele levou tareia da espanholada, e escapou por pouco. O papa Inocêncio X também o ignorou, não lhe passou cartão.
Em 1655 Sousa Coutinho conseguiu ser recebido, mas a título particular, o que foi a mesma cousa que nada: o papa Alexandre VII, tal como os seus antecessores, recusou-se a recebê-lo como embaixador de D. João IV, e continuou a considerar Filipe IV o legítimo rei de Portugal. Sousa Coutinho veio embora, pois, sem ser recebido, e, pior, cravado de inimigos, devido ao seu mau feitio.
Em 1664 foi a vez de D. Francisco Manuel de Melo ser ignorado pelo papa Alexandre VII, apesar das suas hábeis tentativas, que passaram por se mascarar de francês, com o pseudónimo de Comte de Saint Clément, ou de perseguir o papa até Castelgandolfo, mascarado de frade. Numa demonstração de que os "media" na altura não ficavam a dever muito aos de hoje, ainda D. Francisco não tinha entrado na península itálica e já a Gazeta de Paris anunciava a sua "missão secreta", e o embaixador espanhol em Roma escrevia para Madrid a fazer queixinhas a Filipe IV, que vinha aí mais um embaixador tuga, com nome fictício e roupas de francês, mas que a ele não o enganaria.
Só em 1669, 29 anos depois da Restauração e 1 ano depois da paz com Espanha é que o papa se dignou receber oficialmente o embaixador tuga, o Conde do Prado.
Eh eh eh....desde que li « o caso mental português» que não me ria tanto . Desconhecia porventura o Borges da nossa desenvoltura quando escreveu a história universal da infâmia , merecíamos um capítulo inteiro . No pudor , como no despudor , somos de facto os campiões e hoje mesmo , basta abrir um jormal ou o noticiário das oito para confirmar o facto . Cumps .
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