Musil, que retratou um Estado em estado de alegre inconsciência e de «apocalipse estável» (a «Cacânia» de antes da derrocada), sugere-me uma pedagogia urgente e recomendável: a aprendizagem do sentido de possibilidade, diria mesmo a sua introdução nos currículos escolares, desde o básico, como disciplina obrigatória. Para grandes males, grandes remédios. Imagino que, se isso acontecesse, começaria a grassar a insatisfação, nada seria visto como suficiente, todas as fasquias começariam a subir, instalar-se-ia, por fim, um clima de desobediência civil generalizada (era aqui que eu queria chegar). Todo o Estado e todo o país que se prezem deviam aspirar a este estado de sítio, dinâmico e regenerador (contra algumas teorias, não são as guerras que regeneram, é a desobediência civil). Deviam estimular os seus cidadãos a compreender e aceitar a ideia subjacente ao apelo e ao desafio um dia lançado por outra escritora de língua alemã, Christa Wolf: «Imagina que havia uma guerra e ninguém lá ia!»
João Barrento. O Mundo Está Cheio de Deuses. Assírio & Alvim: 2011.
Sem comentários:
Enviar um comentário