quarta-feira, 9 de março de 2011

Do pegar no apêndice para bem pronunciar o português

A Senhora Rattazzi, do Camilo (1880), é das cousas mais divertidas que tenho lido nos últimos tempos. É uma recensão/reacção a um Portugal à vol d'oiseau da dita cuja senhora, que Camilo arrasa de forma verrinosa, com passagens a roçar o brejeiro, denunciando as incorrecções e imprecisões da obra. 

Fica aqui um cheirinho, respeitando a orthographia original. Os itálicos são também do original, e, caso escape a alguém mais distraído, servem para o autor sublinhar as asneiras da Sr.ª Rattazzi ("a princeza" do primeiro excerto).

Reflexionando conspicuamente sobre a nossa deploravel instrucção publica, sahe-lhe de molde a contar que nós, os portuguezes, a um brazileiro que passa chamamos macaca. Que o brazileiro vai passando, e nós dizemos: É una macaca. Não é tanto assim; não se lhe desfigura o sexo. Se a princeza, ao passar, ouviu dizer: é una macaca, isso não era com o brazileiro.
(p. 30)


Na carta XXIII, esta mirifica epistolographa mette a riso a nossa pronuncia nacional, os sons nasaes, as desinencias oês e em , que nos ficaram da lingua galoga, e se pronunciam ouenche, anhon, «com accento violento de nariz, que só bem póde imitar-se pegando n'este appendice com a mão toda para bem proferir o portugaison». Sim, elle é preciso pegar no appendice para bem pronunciar o portugaison.
(pp. 35-36)





A edição consultada é um fac-simile, da Calçada das Letras, e não vai além disso mesmo, de uma reprodução fotográfica do original. Fazia falta uma boa introdução. É que se o leitor de Camilo, em 1880, sabia com toda a segurança quem era a Sr.ª Rattazzi e a obra em questão, o leitor do século XXI não sabe.

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