A vontade hesita no desdém
da descrição, demora
além do que vai narrar. Farrapos
no gancho pronto a recolher
ossos esboroados, a infecção
que doía na trincheira
dessa vala comum da noite diária
sobre a auto-estrada urbana.
Põe no mais alto esses cantares que do passado
descem digitalizados nos discos compactos
e ocupam a fermentação do tráfico.
A sinceridade despedaçada não é
uma ética da devastação
para o que de mim permanece de pé.
Mas uma rugosa ruína nos é comum,
um lixo de onde tem de erguer-se
o que nos faz viver. Como cantava
Lucho Gatica na canção de Briz,
Mi suerte necesita de tu suerte.
Olhos cinzentos que ninguém já diz
quando eu os procurava.
Joaquim Manuel Magalhães, in «A Cal e Canto», Alta Noite em Alta Fraga, Relógio d'Água, 2001.
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