sábado, 26 de maio de 2012

Melhor seria que não me lessem nunca
os que por costume lêem poesia.
Muito além deles conseguir falar
ao que chega a casa e prefere o álcool,
a música de acaso, a sombra de alguém
com o silêncio das situações ajustadas.

Não ser lido por quem lê. Somente
pelos que procuram qualquer coisa
rugosa e rápida a caminho de uma revista
onde fotografaram todo o ludíbrio da felicidade.
Que um poema meu lhes pudesse entregar,
ademais da morte,
um alívio igual ao de atirar os sapatos
que tanto apertam os pés desencaminhados.

Joaquim Manuel Magalhães in "Sangramento", Alta Noite em Alta Fraga, Relógio d'Água,  2001

2 comentários:

  1. É despudorado este poema, quase tanto lê-lo quanto deve ter sido escrevê-lo.

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  2. Por acaso, acho que é daqueles poemas que só pode ser escrito a partir de um certo ponto de cansaço e alguma sabedoria a custo ganha.

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