terça-feira, 1 de novembro de 2011

campos de ténis

os campos de ténis de outono
recordavam-lhe cartas de aniversário
redes pálidas correndo
contra crepúsculos de púrpura
e um tom cinzento pairando
sobre holofotes
casacos de lã
que a chuva do princípio
não aprenderá
a deixar intactos
alguma coisa
dividida entre
o fim e o novo
pequenas mortes
assinalam
outros tantos começos

na sombra que se projeta na parede
de sépia
há uma mulher que tece
uma trama de deixa
que o que desejo
por uma vez
prevaleça
e um pouco penélope
nos modos tímidos
plena de ardis, ela
imaginada por algum demiurgo
a queda dos seus ombros ao de leve
como a variação
da luz
sobre o teu rosto
lembrada talvez
para te entristecer
demasiado o coração

mas o teu olhar vagueia
nos papagaios do outono
dançando sobre os areais
dança de fios e cor
um cortar de vela
rápida garra
contra o vento
agudo como os gestos
dela
projetados na parede
sombra que se perde
num canto do lume

as mãos que tecem
destecem
as pequenas rosas do outono
o teu rosto
perdido no embaraço
de frases
que ferem devagar
que tecem destecem

mãos por baixo da mesa
uma sobre a outra
travando-se
o remorso surdo
esparso na noite lenta
chega-te como gritar
debaixo de água
uma vaga música
entretém tudo à superfície
é um lugar longe longe
o pensamento

e vai para outros lugares
muda-se para portões
que vasos de flores
travaram
o mar insinuado
abaixo dos telhados brancos
chega-te de novo
no gesto de raquete
cortando a bola
em cima da linha
o braço tenso
o movimento desacertado
a bola caindo
o movimento para desperdício
e morte
os pequenos erros
que não se perdoam

no outono
o jovem poeta
viu pela primeira vez
a sua amada numa escada
de uma velha casa em cambridge
havia luzes música
cocktails conversas pedantes
lanternas chinesas suspensas
por fios no ar
uma mulher
um pouco penélope
de olhos verdes cabelo dourado
que a um olá tímido
respondeu com sotaque americano

estas coisas que se adensam em nós aos poucos
se espessam no sangue
nos nossos pensamentos
nos ferem devagar
e definitivamente

Tatiana Faia

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