o sol fora coberto neve começava a cair
espargida sobre os poros negros do cascalho
e jazendo em finas tiras nos telhados inclinados
eu podia ver à distância do cimo deste terceiro andar
não longe havia chaminés
o seu fumo cinzento mais claro do que o cinzento do céu
e mesmo à minha frente renques de habitações pobres
armazéns cartazes luminosos bueiros sinais eléctricos
a arder palidamente carros estacionados carros
em movimento ocasionalmente o raro esboço de uma árvore
esses eu inspeccionei com a cabeça contra o vidro
era minha obrigação olhar e colocar a mim mesmo
a invariável questão onde uma partícula de algo algures
ou no passado que testemunhe a favor do homem
não poderia haver dúvidas de que esses cartazes
ruas trilhos casas frios e cegos estavam relacionados
com a vida interior e no entanto dizia a mim próprio
a dúvida era necessária havia vidas organizadas em torno
desses caminhos e casas e elas as casas
digo eram o análogo o que o homem criou
elas eram-no também por meios transcendentais
isso eu não conseguia conceder
tem de haver uma diferença entre coisas e pessoas
e até mesmo entre actos e pessoas
de outro modo as pessoas que aqui viviam
eram na verdade um reflexo das coisas
entre as quais viviam sempre procurei evitar culpá-las
daí a minha leitura diária dos seus jornais
nos seus negócios e políticas nas suas tabernas filmes
assaltos divórcios homicídios eu tentava constantemente
encontrar sinais inequívocos da sua humanidade comum
(recriação poética de um parágrafo de
Dangling Man de Saul Bellow)