A fim de se completar a imagem outonal desta família na sua cave cheia de água, convém, com efeito, não esquecermos de lhe acrescentar um certo jornalista que, aproximando-se com prudência, em equilíbrio sobre umas quantas tábuas também elas em equilíbrio, vem entrevistar os membros dessa família acerca das suas opiniões quanto à recentíssima democracia alemã, e os interroga sobre as suas esperanças e as suas ilusões - perguntando-lhes, sobretudo, se no tempo de Hitler viviam melhor. A resposta que o visitante recolhe quanto a este último ponto leva-o a sair rapidamente às arrecuas de um quarto nauseabundo, após uma reverência de raiva, de nojo e de desprezo, e a meter-se no seu automóvel inglês ou no seu jipe norte-americano de aluguer, a fim de ir redigir, meia hora depois, à mesa dum bar de hotel reservado à imprensa, diante dum uísque ou dum copo de cerveja alemã autêntica, um artigo sobre o tema «O Nazismo continua na Alemanha».
Uma tal imagem do estado de espírito que reinava na Alemanha neste terceiro outono e que o jornalista em questão e muitos outros, ou de maneira mais geral os visitantes estrangeiros, foram propalando pelo mundo fora, contribuindo assim para a tornar sua, é evidentemente exacta à maneira dela. Perguntavam aos alemães que moravam em caves se viviam melhor no tempo de Hitler, e estes alemães respondiam que sim. É perguntar a alguém que se esteja a afogar se se sentia melhor quando estava em terra; a resposta há-de ser que sim.
Stig Dagerman, Outono Alemão, Antígona, (trad. Júlio Henriques), 1998.
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